Por Jayme Fogagnolo Cobra
No último artigo publicado aqui, falei sobre a medicina baseada em valor. Por esse ponto de vista, o foco principal da prática médica está no desfecho clínico. É importante ter esse conceito bem claro, principalmente quando se faz a análise do ecossistema do setor de saúde que envolve grandes players, tais como: o Sistema Único de Saúde (SUS), as grandes redes hospitalares privadas, as operadoras de planos de saúde, a indústria farmacêutica. Cada um tem seu objetivo e uma alta compreensão do seu papel nessa cadeia. O médico está inserido nesse ecossistema, no entanto, nem sempre ele tem consciência da sua influência.
O jovem, em geral, busca uma faculdade que lhe ofereça uma boa estrutura para que ele se torne um profissional de destaque. O jornal Folha de S. Paulo criou inclusive um Ranking das Melhores Faculdades Medicina. Passando os olhos rapidamente, você percebe que em sua maioria são universidades públicas e, sem dúvida nenhuma, muito conceituadas.
O fato é que o médico no Brasil termina a graduação, ou mesmo a residência, com uma formação muito técnica, restrita mesmo ao conhecimento tradicional médico, naquilo que é ensinado a ele. É isso que precisamos transformar. Faltam conhecimentos administrativos que são tão necessários para entrar nessa briga de cachorro grande que é o setor de saúde. Na minha opinião, esse é um grande gargalo da formação dos médicos, essa ausência de um amplo conhecimento de gestão e do cenário socioeconômico que a atividade do médico está diretamente inserida. Por não ter essas outras competências, que vão além da medicina, o médico acaba por ceder à interferência de outros players na assistência à saúde que não possuem a perspectiva médica, mas estritamente administrativa do negócio. Isso acaba por infuenciar muito o desempenho do médico, o tratamento do paciente e o defecho clínico alcançado.
Vamos usar a reumatologia como exemplo e voltar aos fármacos imunobiológicos. Qual é o nosso objetivo quando tratamos um doente com artrite reumatoide? Buscamos a remissão, de forma que esse doente não evolua com sequelas, diminuindo ou até mesmo eliminando as complicações para, consequentemente, reduzir as limitações e aumentar a longevidade desses doentes. Existe uma série indicadores para monitorar a atividade da doença, que são baseados em dados clínicos e laboratoriais. Eles mostram se doença está em remissão ou não. O ponto central dessa análise é que podemos chegar a esse resultado por vários caminhos, por diversas estratégias de tratamento. É possível chegar nesse objetivo com um investimento de cem mil reais por ano ou com investimento de dez mil reais por ano. É por essa razão que o médico precisa saber fazer a gestão de recursos de forma adequada, para que no momento da tomada de decisão ele saiba quando será preciso fazer uso de um recurso mais oneroso, ou quando é possível utilizar um outro menos impactante para o sistema para chegar ao mesmo desfecho clínico, que é a doença em remissão.
Revivendo frases lacradoras: “saúde não tem preço, mas tem custo!” O médico contemporâneo no Brasil tem que estar habituado a esse cenário. A medicina avança a passos largos e é importante o médico estar envolvido com pesquisa e estar sempre atualizado, mas ele não pode se furtar a responsabilidade de desenvolver outras competências para assumir o papel que lhe cabe como pivô central da assistência à saúde. É preciso mudar o mindset atual e começar a valorizar a remuneração dos serviços médicos e hospitalares pelos resultados.
Jayme Fogagnolo Cobra, Médico na Clínica de Reumatologia Prof. Dr. Castor Jordão Cobra.
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